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quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Rebanho histérico

A história curta é que a presidente da República sancionou o projeto e agora entramos para a lista de países que legalizaram a mais abjeta das práticas humanas.
Todos nós sabemos – ou pelo menos temos alguma noção de – que no mundo real opera a lei da ação e da reação. Claro que existe um incontável número de variáveis operando nas relações pessoais – e cósmicas, por assim dizer –, entretanto, uma das mais visíveis é o princípio da ação e reação.
Por exemplo, quando se colocam crianças para aprender com maus professores, depositando toda a confiança neles e não buscando uma fonte alternativa de conhecimento (ação),  daí surgirão, com certeza quase absoluta, maus alunos (reação). Aí entram as variáveis que impedem que as relações sejam transformadas em tratados de lógica, mas mesmo assim elas não chegam a anular o quadro da realidade ‘cósmica’: “uma árvore má não dá bom fruto” é infalível, pois a árvore má é a “causa formal”.
Falando concretamente: a “educação para todos” do nosso país foi um notável desastre. Sob o pretexto de erradicar o analfabetismo, a única coisa que se conseguiu erradicar quase que totalmente foi o senso comum. A cada nova geração, mais esperanças são depositadas no Estado e mais se deixa de depositar a confiança em si mesmo, na família e em Deus – os pilares por excelência de um povo são. A educação como fim e não como meio – sim, o mesmo problema que abordei no artigo anterior sobre confundir meios e fins – trouxe um notável resultado: o óbvio virou esotérico.
O reflexo da transformação da obviedade em esoterismo é que não mais se percebe que, ao colocar o intelecto dos brasileiros nas mãos de desqualificados, só poderia se gerar pessoas desqualificadas, pois “o discípulo não é superior ao mestre; mas todo discípulo perfeito será como o seu mestre”. Em outras palavras – ou em termos educacionais -, mesmo que houvessem apenas alunos plenamente dedicados ao que lhes é ensinado de agora em diante – obviamente não é, nem nunca será o caso – ainda assim se teria uma maioria esmagadora de desqualificados, pois seus mestres vieram de uma longa linha de pessoas que vêm se desqualificando e fazendo questão de anular os grandes cérebros a fim de que a tal cadeia de emburrecimento não seja perturbada.
No Brasil a burrice começa a ser inculcada nos cérebros a partir dos quatro anos; assim, quando se chega à idade adulta, tudo passa a ser permitido, já que há apenas resquícios de senso comum – o que praticamente impossibilita a pessoa de perceber qualquer perigo iminente.
Esse pequeno comentário anterior foi para falar da sanção presidencial da PLC 03/2013 assinada no último dia 01 de agosto, que, dentre outras coisas, legaliza o aborto no Brasil. Se você ainda não sabe o que está acontecendo, veja este vídeo e compreenda o que se passa: http://www.youtube.com/watch?v=uJXipK6opB0. À época que foi gravado o referido vídeo, o Padre Paulo Ricardo e mais alguns poucos bispos lutavam pelo veto total ao projeto, enquanto a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil lutava apenas pelo veto parcial da lei. Para ver o que significa o veto parcial e o veto total, veja: http://www.youtube.com/watch?v=TTwkr0uaoJM.
Enfim, a história curta é que a presidente da República sancionou o projeto e agora entramos para a lista de países que legalizaram a mais abjeta das práticas humanas (e olha que há uma longa lista no catálogo, uma pior que a outra). Houve até uma discreta comemoração no twitter oficial do Foro de São Paulo. Agora as mulheres têm o poder de optar por assassinar seus próprios filhos com a ajuda estatal.
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O que virá após tão abjeta legislação ser aprovada? Não podemos esperar que de algo ruim saia algo bom, pois “acreditar em mentiras de modo a satisfazer um desejo constitui uma inferioridade pronunciada e um sintoma histérico bem conhecido”, disse o psiquiatra Carl Gustav Jung no ensaio “Depois da catástrofe”, que se encontra na obra Aspectos do drama contemporâneo.
A essência da histeria, segundo Jung, é uma cisão da personalidade em que o indivíduo chega ao estado de contradição existencial, ou seja, o sujeito pensa a e faz z. “Em geral, ocorre um espantoso desconhecimento acerca das próprias sombras, conhecendo-se apenas as boas intenções. E quando não é mais possível negar o mal, surge o “super-homem e o herói” que se enobrece pela envergadura de suas metas” disse Jung.
O povo brasileiro abraçou de vez esse estado de contradição existencial e ainda reelegeu mais duas vezes esse partido – e nada indica que haverá alguma oposição a um quarto mandato. É visível aí imagem do sujeito histérico que não admite estar errado e então redobra a aposta em seu erro. Esta crítica serve também para os cristãos que votaram no PT. O próprio ex-presidente Lula sempre faz questão de lembrar que sem o apoio do eleitorado cristão – sobretudo o católico – seria impossível a ascensão do PT ao poder.
Eis aí uma situação que o Brasil compartilha com a Alemanha nazista a qual Jung fazia referência nesse ensaio: com a ajuda do eleitorado religioso, ambos os povos permitiram ser guiados pela pior estirpe possível de sujeitos. Admitir-se errado em tempos de exacerbado relativismo é uma tarefa hercúlea. A contradição virou a regra. A histeria quase obrigatória.
Para falar da Alemanha da década de 1930, que encontrou em Hitler o personagem perfeito para representar suas neuroses[1], Jung disse no mesmo ensaio:
“Todos se apoiam uns nos outros, num falso sentimento de segurança, pois o apoio de 10.000 é um apoio no ar. A diferença é que não mais se percebe a insegurança. A esperança crescente no Estado não é um bom sintoma e significa, na verdade, que o povo está a caminho de se transformar num rebanho o qual sempre espera de seus pastores bons pastos. Logo o cajado do pastor se converterá em vara de ferro e os pastores em lobos” [§413].
Eis outra situação que o povo brasileiro compartilha com os alemães daquela época: a crença no Estado como o único pai e feitor de tudo. E não estou falando apenas do sujeito que se beneficia com medidas assistencialistas; estou falando de todos nós, em melhores condições, que somos incapazes sequer de mobilizar os próprios vizinhos de bairro para podar o jardim da praça, deixando para o poder público uma tarefa das mais elementares.
Enfim, eis o que foi feito no Brasil: O nosso cajado foi dado ao Estado – esse ‘pastor lupino’ que tem se mostrado o mais cruel e sanguinário de toda a história da humanidade. Agora, como reação, o cajado estatal virou a vara de ferro que fará as curetagens uterinas Brasil afora. Se existe uma coisa a qual sempre poderemos confiar nos lobos é que eles jamais abandonarão sua natureza lupina. Só algum distúrbio psicológico semelhante ao que afeta o eleitorado brasileiro (com a não desprezível ‘ajuda’ do sistema educacional) permite pensar que um dia eles se transmutarão em ovelhas.
Publicado no site da revista Vila Nova.

Leonildo Trombela Júnior é jornalista e tradutor.

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